sexta-feira, 10 de abril de 2009

O castrismo, crônica de uma tirania infame


O castrismo, um regime de um só homem

Do pouco mais de cem anos que tem Cuba como república independente, quase a metade ela passou sob a ditadura férrea de um só homem. Diferente de outros regimes comunistas, o componente pessoal do cubano tem sido primordial,. Nem a União Soviética, nem nenhuma das antigas repúblicas populares do leste da Europa dependeram tanto de uma liderança pessoal e intransferível com a de Fidel.

Um binômio perfeito. O comunismo cubano é inseparável de Fidel Castro e Fidel Castro é inseparável do comunismo cubano. É por isto que mais do que república popular cubana, se tenha falado sempre de castrismo. Um sistema político com umas características próprias, baseado em teses marxistas e levado na prática por um homem sem escrúpulos, viciado pelo poder e implacável com seus inimigos.

Este é um dos motivos pelo qual o socialismo à cubana só foi arraigado com força na ilha. Nenhuma das muitas tentativas de implantá-lo em outros países funcionou, ainda que as autoridades cubanas não tenham economizado esforços para propagar sua revolução pelo mundo. O modo pelo qual o castrismo foi construindo-se e lançando raízes em Cuba é um fenômeno único e portanto nunca mais repetível. Com Castro morre um modo de conservar o poder, um modo de levar um país à ruína, um modo de instalar-se no aparato do Estado até dominá-lo.
De Moncada a Sierra Maestra

Como nasceu o castrismo? Quando foi fundado? Nisto, como em tudo o que rodeia a controvertida revolução cubana, existem várias opiniões. Para alguns o castrismo tem seu início com a entrada dos barbudos em Havana em 1 janeiro de 1959, para outros, um pouco mais tarde, com a frustrada invasão da ilha pelos exilados em 1961. Para os mais favoráveis à causa, o castrismo nasceu em 26 de julho de 1953. Nem um dia antes nem depois, com o assalto dos quartéis de Moncada e Báyamo. Ambos fracassaram e o governo de Fulgencio Batista deteve os instigadores, inclusive Fidel Castro. Uns passaram pelo patíbulo, outros mais afortunados como o próprio Castro, foram presos esperando julgamento.

O 26 de julho é a data mais importante do castrismo, o 26 é o número mais repetido na recente história de Cuba. Assim se chamou o movimento que tomou Havana em 1959 e a onipresente propaganda do regime insiste, nas cidades, aldeias e estradas que “siempre es 26”.

Batista era um ditador no mais puro estilo latino americano com todas suas corrupções e desordens incorporadas. Chegou ao poder através de um golpe de Estado que derrubou Carlos Prío Socarrás. Instaurou um governo autoritário e se dedicou a roubar tudo o que podia com a inestimável ajuda de sua camarilha.

O presídio para o jovem advogado rebelde durou 22 meses. Durante o julgamento a que foi submetido fez valer sua condição de letrado e ensaiou ante o tribunal uma peça gloriosa que posteriormente o castrismo transformou em fetiche, se chamava “A história me absolverá”. Em maio de 1955 Castro foi encarcerado. Os anos de prisão são exaltados pelos comunistas, mas quando se olha nas fotos Fidel saindo da Ilha de Pinos vestido de punta en blanco (ou lique lique , traje de gala típico do caribe) e lendo as cartas que o próprio Castro escrevia, mais parece que foram férias.

Comunicaram minha cela com outra sala quatro vezes maior e um pátio grande, aberto das 7 da manhã até as 9 da noite. Não temos recontagem nem formações durante o dia, Nos levantamos em qualquer hora, (temos) água abundante, comida e roupa limpa. Não sei, porém, quanto tempo mais vamos estar neste paraíso”.

Depois de ser libertado fez a malas e seguiu para o México, ao México do PRI. Sua obsessão era conquistar o poder em Cuba de qualquer modo, e na América espanhola qualquer modo significava pela força. Treinou um bando de guerrilheiros e seguiu para Cuba no Granma, um iate de passeio que havia pertencido a um americano. Granma, quer dizer “Grand Mother” ou “Avó” . Quase não conseguiram chegar e quando puseram o pé na terra foram atacados pelo exército de Batista, mas infelizmente não com muito afinco, porque Castro, Ernesto Guevara e Camilo Cienfuegos, sobreviveram.

Os poucos que sobraram se reagruparam e, com o que salvaram do combate se refugiaram na Sierra Maestra, a região mais pobre e abandonada de Cuba. A estratégia utilizada era simples.

1.- Atacar todos os pequenos quartéis do exército e desaparecer.
2.- Atacar todas as unidades militares que entrassem na serra.
3.- Fugir em debandada quando os militares estivessem em maior número ou se encontrassem em terreno propício.

Castro não inventou nada. Está era e é uma técnica muito conhecida por assaltantes de todo o mundo e de todos os tempos.

Então se produziu o milagre. Os camponeses arruinados da região começaram a dar ajuda aos revoltosos. Um porco aqui, um pouco de milho ali, o filho do fulano que se alistava de forma voluntária, o primo do cicrano que trazia provisões. Aquilo marcou o ponto de mudança. Batista não era bem quisto por ninguém e tampouco era considerado simpático pelos americanos, que não retiraram o apoio logístico e vetaram a venda de armas para seu Governo.

Os barbudos de Castro, por sua vez, possuíam um atrativo arrebatador. Eram jovens, valentes e idealistas. Os jornalistas de meio mundo ficaram do lado deles e fizeram verdadeira campanha. Desta forma o bom nome de Castro foi feito no estrangeiro, a heróica guerrilha tomou embalo de morro abaixo. Depois de muitas escaramuças e de desconforto vivendo no morro, o exército revolucionário (assim chamado por seus líderes) chegou em Havana e lá se fixou. Foi o êxtase. Batista fugiu precipitadamente carregando a parte dos despojos que deu tempo para salvar.

Socialismo ou morte

Dizem que Fidel Castro nunca tinha sido comunista, acho que sempre foi mas ele nunca havia confessado. Os historiadores e jornalistas deduzem que Castro se transformou em comunista quando chegou ao poder. Um caso único e isolado, acreditar que o castrismo veio ao mundo sem ideologia formal, acreditaram nos jovens exaltados cujo programa era mais em devolver a democracia para Cuba do que implantar outra ditadura.

É necessário dizer que primeiro o programa nunca foi cumprido. Segundo, Fidel Castro chegou ao poder, colocou o traseiro na poltrona e se convenceu que só sairia com os pés juntos, como todos os ditadores latinos americanos que o mundo já teve. Apenas com uma pequena diferença, os outros autocratas querem o poder pelo poder ou roubar através do poder. Castro porém passados alguns meses após sua coroação laica nas ruas de Havana, concebeu um programa de transformação social. Depois dele, Cuba não reconhecerá nem os próprios cubanos e isto ele já conseguiu. A Cuba de 2009 não é nem um pálido reflexo do que foi na década de 50, em todos os sentidos.

Mesclando sua tendência autoritária com o fato de que o mundo andava dividido em dois blocos antagônicos, Castro encontrou a forma perfeita de se perpetuar no cargo. Se ficasse alinhado contra um deles com o oposto conseguiria o poder garantido por toda a vida. Moscou não permitiria que seu peão caribenho fosse derrubado, e o mimariam para que a ilha fosse transformada em uma plataforma para que o comunismo se estendesse até o quintal do inimigo americano.

O balbuciante castrismo deu assim seu giro definitivo. Em 1960 as relações com os Estados Unidos se deterioraram consideravelmente. O governo revolucionário ordenou a expropriação de empresas e propriedades americanas em Cuba, ao mesmo tempo em que estabelecia negociações secretas com a União Soviética. Castro entregou seu país à mais cruel ditadura da história por uma questão de ordem prática: continuar mandando. Outras considerações como a oportunidade das teses marxistas ou os desvarios de Che Guevara foram secundários. Fidel Castro com trinta e tantos anos já não era um charlatão com ares de iluminado, a única coisa que queria era que não fizessem com ele o que tinham feito com Batista. Parece prosaico, mas foi assim.

Para evitar que isto acontecesse foi preciso criar um regime implacável dentro e invulnerável fora. Isto foi Cuba de 1961 até 1991. Interiormente o regime transformou a repressão de Batista em inocente jogo de crianças. Foram criados os tribunais populares, povoados por analfabetos sedentos por vingança. As farsas processuais foram seguidos por torturas e fuzilamentos, muitos fuzilamentos. O castrismo nasceu em um paredão. O sangue de milhares de cubanos inocentes foi sua água batismal, um impostor argentino seu sumo sacerdote.

Ajustadas as contas com o passado e modelado o país com os anseios de seus novos donos, começou a sangria humana. Centenas de milhares de pessoas abandonaram a ilha nos últimos anos. No começo de forma legal, depois arriscando a própria vida. Milhões de cubanos vivem hoje no estrangeiro, habitando principalmente os Estados Unidos e Espanha. É a Cuba errante, a que não esquece, a que sonha e chora. O primeiro e definitivo sintoma do castrismo que conhecemos é o cubano emigrante.

Em 1961, parte desses emigrantes conceberam a idéia de invadir Cuba da mesma forma que Castro havia feito anos antes na expedição do Granma. Pediram apoio a Washington e propunham desembarcar na Praia Giron. Os ianques deram alguma ajuda, mas não a suficiente para enfrentar o exército revolucionário. Foi um desastre, um fiasco e além disto uma má idéia. A ameaça externa é o primeiro pilar que busca toda ditadura para consolidar-se. O episódio da Praia Giron (ou Baía dos Porcos) é, na mitologia castrista, um jargão imprescindível, motivo de uma infinidade de canções e poesias, alimento necessário para muita propaganda.

Querendo garantir seu nascente regime, Fidel Castro teve uma das piores idéias do século XX: pedir que Moscou instalasse mísseis nucleares na Ilha. Os russos se empolgaram com a generosidade caribenha e ficaram obcecados em conseguir igualdade atômica com os Estados Unidos, puseram em marcha uma operação secreta. Porém Castro e seus chefes soviéticos foram descobertos pela Força Aérea Americana e um dos famosos aviões U-2 que vigiavam atentos os céus da guerra fria para evitar desagradáveis surpresas ao inquilino da Casa Branca.

Kruschov assegurou que era mentira, não estavam instalando mísseis ou algo parecido. Como era previsível, e ainda mais vindo de um comunista, o que mentia era ele. Kennedy não se deu por vencido e bloqueou os acessos marítimos à Ilha. O ponto crucial da crise ocorreu na última semana de 1962. A semana em que a humanidade quase teve um infarto. Castro, que sempre foi um fanfarrão, desejava que seu padrinho mostrasse os dentes para Kennedy. Não deu certo. Os Estados Unidos era, felizmente para todos, mais poderoso que a União Soviética. Kruschov se retirou, não voltou a tentar com os mísseis e nenhuma outra jogada.

A cacatua de Moscou

A frustrada invasão da Baía dos Porcos e a crise dos mísseis marcaram o castrismo e geraram seu fundo e forma definitiva. Nada essencial tinha mudado até então. Durante as décadas dos 60, 70 e 80, Cuba se transformou em uma economia totalmente dependente das esmolas que recebia de Moscou. Uma economia cujo objetivo mais sagrado sempre foi propagar o socialismo no Terceiro Mundo. Nisto Castro e sua camarilha mostraram um zelo maior do que o dos seus amos soviéticos. Enquanto em Havana os cubanos faziam fila na esquina com a cartilha de racionamento na mão, seu Governo tinha soldados por todo continente africano. A de Angola talvez tenha sido a mais famosa porém não a única. Milhares de cubanos, imbuídos de um espírito de cruzada ao modo socialista, lutaram e morreram em terras longínquas como Etiópia, Argélia ou Somália. De fato, o próprio Che Guevara quase perde a pele no Congo, para terminar morto na Bolívia. E tudo para instaurar mais ditaduras.

Como todo comunista que se preze, Castro acusava os inimigos do que ele planejava em silêncio. O imperialismo socialista, tanto o da União Soviética como o de Cuba, é um dos temas do século XX menos estudados. Por razões óbvias é claro.

Dentro da ilha, o nível de vida e a repressão foram crescendo de forma inversa. Os cubanos, ao longo dos últimos 50 anos, ficaram cada vez mais pobres e menos livres, um paraíso invertido. Um dos muitos projetos que os revolucionários elaboravam era acabar com a monocultura açucareira e fazer de Cuba uma potência industrial ao estilo da Alemanha ou Checolosváquia. Quem faria o milagre seria Ernesto Guevara, um pessoa rápida no gatilho, muito entusiasmo e completamente ignorante sobre a administração de um governo. Não conseguiu nada, apenas dilapidou preciosos recursos em desvairados prazeres durante vários anos. A tal extremo chegou a coisa que Castro lhe retirou e reorientou a economia cubana para proporcionar açúcar ao bloco soviético a preços inflacionados. Nunca a monocultura do açúcar foi tão grande como nos primeiros anos do castrismo. A safra anual se converteu em celebração à qual eram convidados todos habitantes da ilha, desde contadores até professores de escola. Um convite que não podia ser recusado. Nem empregando todo o país conseguiram os objetivos. Como Moscou e seus satélites compravam todo o açúcar a um preço fictício não havia necessidade alguma de se produzir mais ou menos, melhor ou pior, era uma simples tarefa revolucionária à qual Castro comparecia sem complexos e muitos fotógrafos em seu redor.

Os subsídios russos proporcionaram um meio ao regime, mas não aos cubanos. A carne por exemplo, é um luxo para as duas últimas gerações de cubanos. As mesmas que vivem apinhadas em casarões e apartamentos, as mesmas que são obrigadas a consagrar os domingos ao trabalho voluntário, as mesmas que, privadas do pão e das palavras, mantêm a chama da revolução acesa em muitos atos, reuniões dos comitês de defesa e manifestações contra o bloqueio.

O castrismo tardio ou como renascer na miséria

A queda do muro e a desintegração da União Soviética se transformaram em sério desafio à ditadura. Muitos acreditavam que ela se acabaria e que, como na Polônia, Bulgária, Bielo-Rússia ou Estônia se abriria uma nova etapa que derrubaria o regime que lhes escravizava. Grave erro de avaliação. Não levaram em conta que uma ditadura comunista, a cubana, é antes de qualquer outra consideração, a tirania pessoal de um indivíduo, em nome, isto sim, do comunismo.

Com o final da pensão soviética (que os asseclas do regime consideravam vitalícia) colocou para Castro o dilema de abrir o regime ou fechá-lo mais ainda. Ele escolheu a segunda opção, fez porque queria continuar mandando, a decisão foi tomada seguindo a única lógica à qual Fidel foi fiel durante toda a vida: mandar. Um déspota não pode permitir-se a aventuras que ameacem sua poltrona. Cuba amanheceu com o chamado “Período especial”, ou seja apertar o cinto até um extremo limite, junto do intolerável. Tudo menos trocar, tudo menos deixar outro ocupar o lugar do comandante em chefe. Anos de miséria sem nome e repressão sem conta em que até a máquina de propaganda acabou travando. É quase a única coisa que a geração mais jovem de cubanos conheceu.

O novo século, aquele que deveria colocar a luz no final do túnel, trouxe um inesperado renascimento da utopia. Castro saiu com os amigos criados nos escombros fumegantes do muro de Berlim, e a indústria turística trouxe bilhões de dólares para a ilha. O povo cubano não viu nenhum nem outro. Os mais afortunados trabalham em hotéis que são propriedade mista do governo e multinacionais estrangeiras. São pagos em pesos que não possuem valor algum, porém o ministério do turismo cobra em dólares físicos e sonantes.

Aquela dignidade que muitos se referem quando falam de Cuba é isto, trabalhar por quase nada para o Estado ou ver-ser segregado em seu próprio país por estrangeiros que chegam carregados de dólares para tomar sol ou para tratar de assuntos inconfessáveis. Dizem que a Havana de Batista e Beni Moré era, para os ianques, um imenso cassino com ares coloniais e vista para o mar do Caribe. Isto não é certo, mas o certo é que a Havana atual, a de Castro e Saramago, são uma cidade envelhecida e submetida a um regime brutal, vigiada por câmaras de segurança 24 horas, povoada por policiais que a tudo observam. A cidade não é um cassino, é um bordel. Pouco mais pode ser dito.

O legado do castrismo pode ser resumido em duas palavras: ruína e servidão. O resto ainda será escrito.

Um comentário:

Anônimo disse...

Há há há...
Prêmio Machete?

Em tempo: Criaram mais um prêmio, agora com a figura da estátua da liberdade.
Até para premiar os caras estão colonizados pelo Tio Sam....