domingo, 12 de abril de 2009

Três mitos que caem com a crise

Ninguém negará que os efeitos mais visíveis da crise são realmente dramáticos, especialmente para aqueles que a sofrem com mais intensidade. Porém ela tem a vantagem, sob o ponto de vista acadêmico, de separar o joio do trigo e ilustrar quais teorias funcionam ou não. Resta saber se os economistas terão a honradez , ou não, de aceitar os fatos e encontrar a forma de encará-lo, isto se puderem, em suas teorias.

Seja como for, o certo é que a crise está servindo para derrubar três importantes mitos.

1. As quebras bancárias são impossíveis quando não existe o padrão ouro

Uma das razões mais importantes pela qual se abandonou o padrão ouro clássico era que este atava as mãos dos bancos centrais e lhes impedia evitar quebras generalizadas como as que ocorreram durante a Grande Depressão. Pensava-se que, como o dinheiro fiduciário, os bancos centrais sempre poderiam adiar as quebras mediante expansões do crédito que, por sua magnitude eram inviáveis com o padrão ouro.

Mesmo admitindo as supostas propriedades salvadoras das expansões monetárias antiquebra, o certo é que o sistema bancário mundial entrou em bancarrota. Só não estamos assistindo uma corrida de credores em grande escala para tentar resgatar seu dinheiro nos balcões bancários é porque os Estados recapitalizaram os bancos, algo que dito de passagem, também poderiam fazer com o padrão ouro.

Quem pensa que um sistema bancário insolvente pode se manter se flutuando com a ação coordenada dos bancos centrais, confunde os processos de quebra com a suspensão de pagamentos. Quando o valor do ativo cai para baixo do valor do passivo, pouco importa que este tenha linha de créditos abundantes, como as que proporciona um banco central: a entidade em questão está morta.

Terão de procurar uma desculpa melhor contra o padrão ouro.

2. A crise é fruto da desregulamentação

Hoje, assim como em 1929, se pensa que as bolhas que acabam se instalando são conseqüência direta ou indireta da falta de regulamentação do sistema financeiro e portanto de prega a regulamentação massiva. A idéia é simples: se deixarem as indivíduos a atuar livremente, eles assumirão riscos extraordinários que serão pagos por todos; por conseguinte demos regulamentar-lhes e deixá-los sob uma supervisão que impeça que adotem uma política de riscos extraordinários.

Mas surge um problema: se a crise de 29 deu lugar à regulamentação, que sentido tem deduzir que esta nova crise se deve à desregulamentação ? Basicamente, os encarregados de supervisionar o sistema financeiro, como por exemplo, o atual secretário do Tesouro dos Estados Unidos, querem se eximir de qualquer responsabilidade por negligência, e por isso dizem que a crise foi gerida em certas áreas da economia que escaparam da regulamentação pós Grande Depressão. Portanto, basta estender a regulamentação às novas realidades e o problema será resolvido. A desregulamentação só é um problema na medida em que permite explorar com impunidade as estratégias financeiras que deram lugar à crise; claro que estas estratégias continuarão sendo exploráveis com a montanha de regulamentações que agora estão propondo.

3. Tudo está justificado para lutar contra a deflação

Quase todos os líderes consideram que o grande problema que o Ocidente enfrente é a deflação, quer dizer, uma forte contração do crédito e da maioria dos preços, especialmente dos ativos. Por este motivo sustentam que qualquer coisa deve ser feita para evitá-la, inclusive o uso de ferramentas que em tempos normais seriam consideradas aberrações.

O caráter grotesco desta idéia pode ser ilustrado, por exemplo , com a proposta de Milton Friedman que queria que a Reserva Federal lhe desse a máquina de imprimir dinheiro para que ele pudesse jogá-lo de helicópteros e evitar assim que os preços deixassem de cair.

A experiência islandesa e das economias do leste europeu nos demonstram que a deflação só é o maior problema enquanto não coloque em risco o crédito do Estado. Nestes países, a quebra de fato do Estado derrubou o valor da divisa local, em alguns casos em até 40%, fazendo com que alguns deles deixassem de importar bens. Obviamente, o problema deixou de ser a deflação e passou a ser uma hiperinflação incipiente, como reflete a evolução dos preços na Islândia. Que isto não seja também o caso dos Estados Unidos ou Europa se deve ao fato de que os políticos americanos e europeus não terem ficado ainda suficientemente ambicioso, leia-se suicidas. Mas com o tempo...

Definitivamente alguns economistas continuam sem entender que a origem da crise se encontra em uma estratégia financeira instável ( endividar-se a curto prazo para investir a longo prazo) que foi incentivada pelos bancos centrais e privilégio que o estado concedeu aos bancos. Não é pois culpa do padrão ouro, nem da desregulamentação, nem de passividade dos Governos ante a deflação.

A solução para as criser deve passar em não incorrer em barbaridades já cometidas em tempos anteriores, senão em por fim aos privilégios do sistema bancário e no rebaixamento enérgico do peso do Estado. Porém é claro, para muitos vale mais a pena construir mitos do que renunciar a suas rendas.

Nenhum comentário: